Inacreditável veto!
Quase 50% da população brasileira vive nas grandes regiões metropolitanas (RMs) com mais de um milhão de habitantes. É nelas que a crise da mobilidade se mostra mais aguda: dificuldade e custo dos deslocamentos, perdas de tempo, acidentes, poluição, déficits. O diagnóstico desses males é quase unânime. Destaca-se, dentre as causas do drama, a superposição de jurisdições e fragmentação de responsabilidades em serviços de transportes operados pelas três esferas de governo em um mesmo território, em cada RM. Rodovias e ferrovias federais; ônibus e trens ou metrôs metropolitanos; ônibus municipais; caminhões de todos os tipos e origens. Múltiplas redes de circulação se superpondo e sendo planejadas e construídas sem se articularem; serviços operados com escassa coordenação. É óbvio que não pode dar certo. Essa queixa tem décadas.
Pois bem.
Em 19 de junho p.p. foi publicada a lei federal 13.683, que altera pontos selecionados do Estatuto da Metrópole (de 2015) e da Lei da Mobilidade (de 2012). Dentre eles, o que amplia o prazo para elaboração dos planos de mobilidade dos municípios. A versão aprovada no Legislativo acrescentava ainda um parágrafo, estipulando que as RMs com mais de 1 milhão de habitantes poderiam "{...] constituir uma autoridade metropolitana de transportes, no formato de consórcio público previsto na Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005, com o objetivo de integrar o planejamento e a execução das ações de transportes por meio da apresentação de um Plano de Mobilidade para o sistema de transportes na região metropolitana de forma única, conforme regulamento.” (grifamos)
Esse parágrafo tão bem-vindo, quiçá catalisador de novas políticas institucionais em um atormentado setor da economia, foi vetado pelo Presidente da República! O único veto na lei aprovada no legislativo.
No final deste post reproduzimos o texto do parágrafo original e as razões (??) do veto. Por causar burocratização?! Dá prá entender?
Fica aqui a sugestão/convite aos especialistas da mobilidade: vamos minutar um projeto de lei restabelecendo essa proposição, aprimorá-la para afastar qualquer dúvida de interpretação, dotá-la de efetiva capacidade persuasória e em seguida submetê-la a um parlamentar com familiaridade no setor de transportes. Quem sabe consigamos suscitar o debate e reapresentar a proposta ao Legislativo federal ainda este ano. Poderemos inclusive estudar alternativas organizacionais, por exemplo a de associar a autoridade de transportes ao conselho de desenvolvimento, no caso das regiões metropolitanas institucionalmente mais amadurecidas.
As eleições estão próximas. É uma boa hora para agir.
O dispositivo vetado introduziria um novo § 6º no art. 24 da Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012, como segue:
“§ 6º Para fins do cumprimento da obrigatoriedade de apresentação do Plano de Mobilidade Urbana de que trata esta Lei, as regiões metropolitanas com mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes poderão constituir uma autoridade metropolitana de transportes, no formato de consórcio público previsto na Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005, com o objetivo de integrar o planejamento e a execução das ações de transportes, por meio da apresentação de um Plano de Mobilidade para o sistema de transportes na região metropolitana de forma única, conforme regulamento.”
As razões do veto
“A possibilidade de plano de mobilidade único para o sistema de transporte em região metropolitana poderia admitir a interpretação da substituição dos Planos de Mobilidade municipais das cidades envolvidas, que são mais amplos, específicos e que abarcam soluções das formas mais básicas de deslocamento, podendo causar burocratização das decisões para o deslocamento de pessoas e cargas pelo espaço urbano e, sobretudo, podendo afastar a caracterização de auto aplicabilidade da lei quanto à obrigatoriedade dos planos de cada município.”
Fonte: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2018/lei-13683-19-junho-2018-786869-veto-155871-pl.html
Imagem acima adquirida de Bigstock